quarta-feira, 3 de abril de 2013

Horas Tristes



Eu sinto que esta vida já me foge
Qual da harpa o som final,
E não tenho como o náufrago nas ondas
Nas trevas um fanal!
Eu sofro e esta dor que me atormenta
É um suplício atroz!
E pra contá-la falta à lira cordas
E aos lábios meus a voz!
Às vezes no silêncio da minha alma,
Da noite na mudez,
Eu crio na cabeça mil fantasmas
Que aniquilo outra vez!
Dói-me inda a boca que queimei sedento
Nas esponjas de fel,
E agora sinto no bulhar da mente
A torre de Babel!
Sou triste como o pai que as belas filhas
Viu lânguidas morrer,
E já não pousam no meu rosto pálido
Os risos do prazer!
E, contudo, meu Deus! Eu sou bem moço,
Devera só me rir,
E ter fé e ter crença nos amores,
Na glória e no porvir!
Eu devera folgar nesta natura
De flores e de luz,
E, mancebo, voltar-me pro futuro
Estrela que seduz!
Agora em vez dos hinos de esperança,
Dos cantos juvenis,
Tenho a sátira pungente, o riso amargo,
O canto que maldiz!
Os outros, - os felizes deste mundo,
Deleitam-se em saraus;
Eu solitário sofro e odeio os homens,
Pra mim são todos maus!
Eu olho e vejo... - a Veiga é de esmeralda
O céu é todo azul.
Tudo canta e sorri... Só na minha alma
O lodo dum paul!
Mas se ela - a linda filha do meu sonho,
A pálida mulher
Das minhas fantasias, dos seus lábios
Um riso, um só me der;
Se a doce virgem pensativa e bela,
- A pudica vestal
Que eu criei numa noite de delírio
Ao som da saturnal;
Se ela vier enternecida e meiga
Sentar-se junto a mim;
Se eu ouvir sua voz mais doce e terna
Que um doce bandolim;
Se o seu lábio afagar a minha fronte
- Tão fervido vulcão!
E murmurar baixinho ao meu ouvido
As falas da paixão;
Se cair desmaiada nos meus braços
Morrendo em languidez,
De certo remoçado, alegre e louco
Sentira-me talvez!...
Talvez que eu encontrasse as alegrias
Dos tempos que lá vão,
E afogasse na luz da nova aurora
A dor do coração!
Talvez que nos meus lábios desmaiados
Brilhasse o seu sorrir,
E de novo, meu Deus, tivesse crença
Na glória e no porvir!
Talvez minha alma ressurgisse bela
Aos raios desse sol,
E nas cordas da lira seus gorjeios
Trinasse um rouxinol!
Talvez então que eu me pegasse à vida
Com ânsia e com ardor,
E pudesse aspirando aos seus perfumes
Viver do seu amor!
Pra ela então seria a minha vida,
A glória, os sonhos meus;
E dissera chorando arrependido:
- Bendito seja Deus! -
Abril – 1858
Autor: Casimiro de Abreu

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