quarta-feira, 3 de abril de 2013

Canção do Exílio

 Se eu tenho de morrer na flor dos anos,
 Meu Deus! Não seja já;
 Eu quero ouvir na laranjeira, à tarde,
 Cantar o sabiá!
 Meu Deus, eu sinto e tu bem vês que eu morro
 Respirando este ar;
 Faz que eu viva Senhor! Dá-me de novo
 Os gozos do meu lar!
 O país estrangeiro mais belezas
 Do que a pátria, não tem;
 E este mundo não vale um só dos beijos
 Tão doces duma mãe!
  
Dá-me os sítios gentis onde eu brincava
Lá na quadra infantil;
Dá que eu veja uma vez o céu da pátria,
O céu do meu Brasil!
Se eu tenho de morrer na flor dos anos,
Meu Deus! Não seja já!
Eu quero ouvir na laranjeira, à tarde,
Cantar o sabiá!
Quero ver esse céu da minha terra
Tão lindo e tão azul!
E a nuvem cor de rosa que passava
Correndo lá do sul!
Quero dormir à sombra dos coqueiros,
As folhas por dossel;
E ver se apanho a borboleta branca,
Que voa no vergel!
Quero sentar-me à beira do riacho
Das tardes ao cair,
E sozinho cismando no crepúsculo
Os sonhos do porvir!
Se eu tenho de morrer na flor dos anos,
Meu Deus! Não seja já;
Eu quero ouvir na laranjeira, à tarde,
A voz do sabiá!
Quero morrer cercado dos perfumes
Dum clima tropical,
E sentir, expirando, as harmonias
Do meu berço natal!
Minha campa será entre as mangueiras
Banhada do luar,
E eu contente dormirei tranquilo
À sombra do meu lar!
As cachoeiras chorarão sentidas
Porque cedo morri,
E eu sonho no sepulcro os meus amores
Na terra onde nasci!
Se eu tenho de morrer na flor dos anos,
Meu Deus! Não seja já
Eu quero ouvir na laranjeira, à tarde,
Cantar o sabiá!

Lisboa — 1857
Autor: Casimiro de Abreu 

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